CPAC: é hora de furar as bolhas, reforçar muralhas e construir pontes com o mundo

Como festa, irretocável. Oportunidade de interação e de networking – mas a opção em reforçar o brilho de estrelas em detrimento de impulsionar a pluralidade que há entre os conservadores acaba revelando uma bolha centrada nos egos

CPAC reforçou a representatividade política, econômica e cultural que os Conservadores têm, mas apontou para a necessidade de abrir-se para a realidade. Foto de Letícia Mattos

Por Alfredo Bessow
– jornalista

No período que antecede qualquer evento do qual eu participe tenho o hábito de definir claramente o que eu busco com aquela participação. Com o Cpac não foi diferente: defini como objetivo “fazer networking”, rever pessoas e conhecer muitas com as quais apenas tinha interação virtual. E dentre estas últimas, minha opção não era de tietar estrelas que gozam do justo reconhecimento e fascínio de muitos, mas sim buscar a interação com pessoas do mundo real para entender os seus desafios e seus enfrentamentos enquanto conservadores que vivem e atuam longe dos holofotes e enfrenta a luta cotidiana contra mecanismos opressores como mídia, escola e grupos familiares.

Mas tudo a seu tempo.

Dizer que foi mais do mesmo talvez seja exagero, porque na realidade foi mais do menos – com o pecado de centrar-se demasiado em temáticas que se repetem, convidando pessoas que pouco ou nada agregam à discussão, muitas vezes mais centradas no “eu” do que no “nós”. A opção pelo estrelismo costuma ter seu preço e foi isso que se notou mais pelas ausências do que verdadeiramente por fatores novos.

Eu sei que todos estão angustiados, mas com certeza haverá amanhã e é com este amanhã que as pessoas deveriam estar preocupadas e comprometidas, porque o amanhã só existirá com o “nós” e não na soberania do eu.

Como “evento conservador” faltou um olhar verdadeiro sobre o que acontece na Argentina, no Perú, na Bolívia, no Chile e na Nicarágua – onde as eleições serão de Ortega contra quem ele escolher como adversário. Como entender a não participação de movimentos conservadores da Europa e mesmo uma discussão sobre o Grupo de Madrid, incipiente projeto de unir representantes da Espanha, França, Itália, Alemanha, Áustria, Polônia e Hungria – para fixar em alguns países que poderiam contribuir com ideias diferentes de estruturação do pensamento de Direita, fora da caixinha.

É preciso também deixar clara a linha que divide omissão de esquecimento – porque tivemos as duas estratégias largamente utilizadas, inclusive com uma pitada de preconceito. O que, cá entre nós, sempre é delicado de abordar.

Talvez pela origem dos organizadores, mas o reducionismo conceitual sempre é perigoso, como se só houvesse vida inteligente nas redes sociais ou em São Paulo. Se houve miopia ao trazer convidados estrangeiros, houve cegueira em relação aos desafios nacionais e uma velha discussão de que a vida não se resume às redes sociais.

É importante destacar que eventos como este são importantes também para que as pessoas saibam que não estão sozinhas, mas, para que isso efetivamente funcionasse como catapulta e escudo, fez falta trazer o Brasil em sua pluralidade de vozes para dentro do evento. Faltou trazer a Gazeta do Povo para mostrar sua luta por um jornalismo efetivo. A luta, ainda incipiente, do Diário Popular de ressurgir como voz conservadora. O papel do ND+ de Florianópolis, lutando para se manter como uma voz diferenciada em um estado que teve seu jornalismo devastado pela RBS – um câncer que elege bancada de senadores, deputados federais e estaduais em SC e no RS.

Claro que algumas lacunas foram lamentáveis, como por exemplo a falta de vozes de movimentos populares – e há muitos hoje em nosso país com o viés conservador; de ativistas que atuam em associações e sindicatos; em clubes de serviço e no trabalho assistencial.

No entanto, de todos os hiatos, estratégicos ou não, o mais incompreensível e inaceitável foi, na minha opinião, a estratégia deliberada de fazer do CPAC um evento apenas e tão somente para vozes católicas – como se fosse uma sombra a mais da presença de Olavo do Carvalho a guiar os passos. E que fique claro: não questiono o seu papel como bússola ou lâmpada na travessia que ainda estamos fazendo, mas também não omito a forma preconceituosa como ele trata protestantes e evangélicos – algo que se repete em seus discípulos. Da mesma forma como não cabe julgar os católicos pelas heresias e descalabros da Teologia da Libertação é, no mínimo, um descalabro estereotipar todos os protestantes e evangélicos pelo farisaísmo e a hipocrisia de certas denominações supostamente estruturadas sobre a Palavra de Deus.

Mesmo cadastrado como imprensa, paguei para participar porque considero fundamental apoiar as iniciativas e se críticas faço é pelo olhar de quem sabe que é necessário que apostemos sempre no mais do mais e não nos contemos com o mais do mesmo que é eufemismo para mais do menos.

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