O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ontem a suspensão de todos os processos judiciais que discutem a legalidade da ‘pejotização’ — prática em que empresas contratam profissionais como pessoa jurídica (PJ) para evitar o vínculo empregatício e os encargos trabalhistas. A suspensão permanecerá válida até que o Plenário julgue o mérito do recurso extraordinário.

A decisão foi tomada no âmbito do Tema 1389 de repercussão geral, cuja tese, quando definida, será obrigatória para todos os tribunais do país. O ministro argumenta que o STF já possui jurisprudência no sentido de validar contratações por CNPJ que não configurem vínculo de emprego. “O descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica, resultando na multiplicação de demandas que chegam ao STF, transformando-o, na prática, em instância revisora de decisões trabalhistas”, afirmou.

Para ele, a resistência da Justiça especializada em seguir a orientação do Supremo tem provocado insegurança jurídica e sobrecarga processual. De acordo com o ministro, muitos dos recursos que chegam à Corte envolvem justamente decisões da Justiça do Trabalho que insistem em considerar fraudulenta a ‘pejotização’, mesmo quando não há elementos que justifiquem o reconhecimento do vínculo formal. “Parcela significativa das reclamações em tramitação nesta Corte foram ajuizadas contra decisões da Justiça do Trabalho que, em maior ou menor grau, restringiam a liberdade de organização produtiva”, afirmou.

O único voto contrário à repercussão geral foi o do ministro Edson Fachin, que defende a competência da Justiça do Trabalho para julgar esses casos, por tratar-se de um ramo especializado no equilíbrio entre empregadores e trabalhadores. Juristas e especialistas em direito trabalhista divergem da decisão.

Para a advogada Juliana Raffo, especialista em direito empresarial, o julgamento do STF pode contribuir para padronizar entendimentos e reduzir riscos jurídicos, especialmente em contextos empresariais legítimos. “O modelo de contratos ‘PJ’ ganhou força e, convenhamos, nem sempre é fruto de tentativa de burlar a lei trabalhista, mas, sim um formato usado como melhor aos interesses das partes, inclusive, dos reais prestadores de serviços que buscam separar sua responsabilidade da pessoa física dos riscos da sua operação, ou buscam melhor planejamento tributário da sua atividade, e passam a se apresentar e se organizar como empresa no mercado, o que ocorre mesmo quando estamos diante de uma empresa de um único sócio”, explicou a jurista.

Já a advogada Fernanda Garcez, mestre em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), vê com preocupação a paralisação dos processos e a possível validação ampla da pejotização. “Eu vejo, sem dúvidas, a questão da demora na outorga da prestação judicial, eventualmente para a parte trabalhadora que ingressa em juízo e pede ali os seus direitos. E para as empresas também vejo bastante impacto em relação ao cálculo de juros, decorrentes da suspensão processual”, alertou.

Correio Braziliense

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