quinta-feira, julho 17, 2025
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Análise: Brics ampliado expõe dissensos, contradições e falta de foco

A primeira declaração de líderes do Brics, em 2009, era um documento de 16 parágrafos e 977 palavras. Ali estava o essencial: defesa de uma nova ordem multipolar, mais representatividade às nações emergentes, combate ao protecionismo comercial, apoio à incipiente transição energética.

Dezesseis reuniões depois, o comunicado final de líderes no Rio é um mastodonte prolixo e sem foco. São 126 parágrafos e 17.624 palavras que falam sobre praticamente tudo: terrorismo na Caxemira, comércio de diamantes, cooperação acadêmica. Até um fórum de jovens cientistas entrou na lista de assuntos.

O Brics vive hoje a tragédia dos comuns: o livre acesso e a demanda irrestrita (um paragrafozinho a mais todos os anos) de um recurso finito condena estruturalmente o objeto (a declaração em si) e provoca seu esgotamento. Quantos mais temas, menos força.

O que quer o Brics? Pelo que exatamente luta? O que realmente importa para o grupo? São questões cada vez mais difíceis de responder.

É uma pena e é uma contradição. Justo no momento histórico em que o Brics ultrapassa o G7 em participação do PIB global.

Desde a criação do grupo e contando apenas seus cinco primeiros países-membros, o que era uma derrota nessa competição por relevância econômica (Brics 26% x 34% G7) virou uma apertada vitória quando se mede a riqueza pela paridade do poder de compra (32% x 30%).

Críticos dirão que o Brics nunca passou de um acrônimo sem coerência inventado pelo economista Jim O’Neill e transformou-se em um bloco antiocidental e autoritário. Nada disso é o ponto.

Brasil, África do Sul, Índia e Indonésia são democracias vibrantes — apesar de todas as falhas — e que valorizam o diálogo fluido com o Ocidente ampliado.

E a ideia do Brics era justamente permitir que estrelas ascendentes da economia mundial — algumas das quais nunca entraram em voo de cruzeiro — tivessem mais coordenação e efetividade na defesa de suas bandeiras. Não deixar que o futuro seja rotulado ou resumido por um economista do Goldman Sachs.

Participar ativamente do Brics permite ao Brasil fortalecer sua autonomia estratégica, diversificar parceiros e moldar novas arquiteturas globais de poder. Reforça nossa posição histórica de autonomia e pluralidade de alianças. Proporciona uma plataforma de cooperação Sul-Sul e interlocução privilegiada na busca por acesso a mercados na Ásia.

O ponto não é “se” o Brics faz sentido para o Brasil, mas “como” tem se comportado e para onde ruma com a ampliação desorganizada de países.

Na semana em que a revista britânica The Economist questionou a influência de Lula no exterior e o retratou como hostil ao Ocidente, a declaração de uma cúpula no Brasil quase acabou em impasse provocado pelo Irã.

A defesa de uma reforma da ONU ficou a ponto de melar por causa do Egito e da Etiópia. A Rússia usa o grupo para condenar ataques contra seus civis enquanto sequestra crianças ucranianas. O Irã — de novo o Irã — assina uma declaração que repudia o financiamento ao terrorismo sendo o patrocinador-mor do Hamas e do Hezbollah.

O Brics, cheio de contradições internas, terá dissensos cada vez mais problemáticos com a sua expansão. Falta foco. Menos é mais. Que se volte aos 16 parágrafos.

Fonte: CNN Brasil

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