Afeganistão: a história de um país em ponto estratégico apelidado de ‘cemitério de impérios’

Sem saída para o oceano e caracterizado por regiões montanhosas, o Afeganistão é um país historicamente importante nas rotas comerciais e disputas políticas da Ásia.

Vizinho de países com poderio nuclear como o Paquistão e a China, a importância da geopolítica do Afeganistão é fácil de ser avaliada. O país também faz fronteira com o Irã, Turcomenistão, Uzbequistão e Tajiquistão.

O terreno montanhoso do Afeganistão tem facilitado a operação de grupos guerrilheiros e dificultado a ação de tropas invasoras.

Frequentemente descrito como um país de grande beleza natural, o Afeganistão vem sendo ao longo dos anos palco de conflitos étnicos, disputas religiosas e divisões tribais que para muitos têm mantido grande parte da população em uma realidade descrita como medieval.

O país está no centro de disputas geopolíticas há anos, culminando com a invasão pelos soviéticos em dezembro de 1979 a pretexto de combater os guerrilheiros islâmicos que ameaçavam levar às repúblicas soviéticas sua luta santa em nome do Islã.

Na história recente, o Afeganistão sofreu tanta instabilidade e viveu tantos conflitos armados que sua economia e infraestrutura ficaram em ruínas – e grande parte de sua população tornou-se refugiada.

Em 1996, após anos de guerra civil, o grupo fundamentalista sunita Talebã tomou o controle da capital, Cabul, e impôs um regime extremista no país.

O Talebã foi derrubado por forças americanas, que invadiram o país em 2001 após os ataques da Al-Qaeda nos Estados Unidos. Os americanos alegavam que o Talebã dava apoio e abrigo a Osama Bin Laden, líder da Al-Qaeda e mentor dos ataques à torres gêmeas do World Trade Centre em Nova York.

O governo instalado em seguida, reconhecido internacionalmente e com uma nova Constituição adotada em 2004, teve muitas dificuldades em estender sua autoridade além de Cabul e forjar uma união nacional.

Em agosto de 2021, os Estados Unidos, Reino Unido e outras nações que formavam a aliança militar que garantia a segurança no país, anunciaram a retirada de suas tropas do Afeganistão.

Imediatamente após a saída dos militares estrangeiros, o Talebã voltou a tomar controle de importantes cidades.

O grupo armado avançou rapidamente e no domingo, 15 de agosto, tomou a capital Cabul depois que o então presidente Ashraf Ghani abandonou o governo e fugiu rumo ao Tajiquistão.

Cenas caóticas se seguiram ao anúncio da volta do Talebã ao poder. Milhares de afegãos se espremeram no aeroporto internacional de Cabul tentando embarcar num avião qualquer para fugir do país.

Depoimentos de diversas mulheres demonstravam preocupação com o retorno do Talebã. Notoriamente, o grupo defende a implantação rigorosa da lei islâmica conhecida por sharia que limita o acesso das mulheres à educação e impõe costumes sociais extremos, como por exemplo, o uso da famosa burca, vestimenta que cobre completamente o corpo das mulheres, apenas com uma tela à altura dos olhos para permitir a visão.

A vida sob o Talebã na década de 1990 forçou as mulheres a usar a vestimenta. Os islamistas radicais restringiram a educação para meninas com mais de 10 anos e punições brutais foram impostas, incluindo execuções públicas.

Militantes do grupo afirmaram à BBC que estão determinados a reimpor sua versão da sharia, a lei islâmica, que inclui apedrejamento por adultério, amputação de membros por roubo e proibição de meninas com mais de 12 anos de ir à escola.

Mas um porta-voz do Talebã prometeu que os militantes respeitarão os direitos das mulheres e da imprensa.

Ele disse que as mulheres poderão sair de casa sozinhas e continuarão a ter acesso à educação e ao trabalho.

O porta-voz acrescentou que, num eventual governo Talebã, haveria liberdade de imprensa, mas não se permitiria “assassinato de caráter”.

Novamente, o Afeganistão, país de fundamental importância na geopolítica global, voltava ao noticiário internacional, em mais uma reviravolta de poder.

O mundo assistiu com perplexidade o desespero de milhares de afegãos amedrontados com a volta do Talebã, temendo que o país mergulhe em um novo retrocesso social e em um caos econômico.

Cabul
CRÉDITO,KONSTANTIN NOVAKOVIC/GETTY IMAGES Legenda da foto, Cabul é a capital e principal cidade do Afeganistão, país cuja vida social e política é muito influenciada pelo islã

Ocupação ocidental

A partir de 2001, as tropas de combate estrangeiras da Otan (aliança militar do Atlântico Norte)passaram a ser responsáveis por manter a segurança dentro do território afegão. Em dezembro de 2014, no entanto, a missão militar da Otan foi encerrada, o que foi seguido de um aumento das ações militares do Talebã .

O islã, além de ser a religião dos afegãos, é a base para a cultura e os costumes do país. A maioria da população é sunita (cerca de 85%), e a pequena parcela restante segue a versão xiita do islã (cerca de 15%). A sociedade afegã valoriza muito conceitos como honra ou vergonha e considera a família uma referência essencial.

O Afeganistão tem uma história rica no mundo das artes, incluindo a literatura e a arquitetura, mas as atividades culturais sofreram muito com as guerras internas e o avanço do fundamentalismo islâmico.

FATOS

LÍDER (deposto em agosto de 2021 pelo avanço do Talebã)

Presidente: Ashraf Ghani

Abdullah Abdullah e Ashraf Ghani
CRÉDITO,GETTY IMAGES Legenda da foto, O presidente Ashraf Ghani (dir) formou um governo com seu antigo rival Abdullah Abdullah

Eleito presidente pela primeira vez em 2014 e reeleito em 2019, Ashraf Ghani liderou um governo de unidade com o ex-rival – em seu governo, executivo-chefe – Abdullah Abdullah. Ghani substituiu Hamid Karzai, que liderou o governo central durante 12 anos após a derrubada do Talebã, em 2001.

Integrante da maioria pashto, Ghani é um ex-tecnocrata que passou grande parte de sua carreira fora do Afeganistão – trabalhando tanto como um acadêmico nos Estados Unidos como para o Banco Mundial.

No início de seu governo ele introduziu algumas medidas de combate à corrupção, mas sem grandes sucessos.

Com a retirada das tropas da aliança militar que garantia segurança ao seu governo, Ghani viu o rápido avanço do Talebã no território afegão Sem encontrar resistência, o grupo dominou importantes cidades no país e se aproximou da capital Cabul em velocidade impressionante.

Temendo retaliações, Ashraf Ghani abandonou o palácio presidencial e segundo relatos, procurou refúgio no vizinho Tajiquistão.

MÍDIA

A maioria dos veículos de mídia afegãos é privada, e o mercado de radiodifusão é bastante competitivo.

Há dezenas de canais de televisão e mais de 170 estações de rádio FM. O grupo Moby opera algumas das principais estações de TV, incluindo a popular Tolo TV.

Grande parte do conteúdo das TVs privadas consiste em programas de música turca ou indiana e séries, numa programação inspirada nos formatos ocidentais.

O Serviço Mundial da BBC está disponível em FM nas principais cidades e em ondas curtas por todo o país. Há transmissões esporádicas de rádios em FM operadas pelo Taliban e pelo grupo Estado Islâmico.

Centenas de jornais e revistas, de diferentes donos, são publicados no país. O jornal mais popular é o Hasht-e Sobh, de propriedade privada.

A imprensa escrita tende a refletir mais abertamente sobre acontecimentos internos do Afeganistão do que as redes de rádio ou TV.

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