Alexandre de Moraes e o “guarda da esquina”

“Ainda tem muita gente para prender e muita multa para aplicar.” Quem dera o Brasil pudesse ouvir uma frase dessas de alguma autoridade responsável por conduzir grandes operações de combate à corrupção. Ou, talvez, de algum secretário de Segurança Pública recém-nomeado por algum governador eleito, prometendo combater o crime com firmeza assim que for empossado em janeiro. Ou, ainda, de algum parlamentar que, conhecendo bem o enorme labirinto processual brasileiro, criado pelas leis aprovadas no Congresso Nacional, queira usar seu mandato para endurecer a lei contra a bandidagem, quem sabe lutando pela volta da prisão após condenação em segunda instância.

Afinal, o que não falta no Brasil é gente para prender e multa para aplicar. Somos o país dos 40 mil homicídios por ano, dos quais apenas uma pequena parcela é solucionada; dos assassinos identificados, só uma parte é capturada e levada a julgamento; dos réus, apenas parte é condenada; e, dos condenados, são raros os que cumprem integralmente sua pena. Se é assim nos crimes contra a vida, o que dizer de ladrões, assaltantes, estupradores ou traficantes? E quanto aos corruptos, também poucas vezes desmascarados, e dos quais é possível quase contar nos dedos os que estão atrás das grades?

Quando Moraes fala de “gente para prender”, ele se refere também a empresários que trocavam ideias pelo WhatsApp, parlamentares que manifestam seu desagrado com decisões do Supremo, ou formadores de opinião que lembram verdades inconvenientes sobre Lula

Mas não; quem afirmou que “ainda tem muita gente para prender e muita multa para aplicar” foi o ministro Alexandre de Moraes, integrante do Supremo Tribunal Federal e presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Falava em um seminário intitulado “STF em ação”, que teve painel cujo tema era “O guardião da Constituição e a harmonia entre os poderes”. Portanto, homicidas, ladrões, assaltantes, estupradores, traficantes e corruptos podem respirar aliviados. Eles seguirão se beneficiando de estruturas de investigação sucateadas; de audiências de custódia e todo tipo possível e imaginável de garantismo penal; de indultos, “saidinhas” e progressões de regime; do labirinto processual que, bem navegado, garante que um réu jamais veja o sol nascer quadrado; de decisões de tribunais superiores que revertem jurisprudência e anulam processos, mesmo passados vários anos, por tecnicalidades ou suspeições inventadas na hora, ou que libertam um traficante flagrado com quase 200 quilos de cocaína porque ele tinha “bons antecedentes”.

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