BOMBA! Documentos inéditos detalham plano para sequestrar e matar Sergio Moro

Os muros de 3 metros de altura impediam que quem estivesse do lado de fora
observasse o que se passava dentro da chácara. As serpentinas de arame
farpado desestimulariam qualquer aventureiro a entrar sem ser convidado ou
alguém a fugir sem passar por um portão de ferro, o único acesso.
A privacidade era garantida. O lugar é cercado por uma densa vegetação, o
vizinho mais próximo, uma senhora de quase 80 anos, está a mais de 200
metros de distância. Havia outros pontos positivos. A propriedade fica a 48
quilômetros de Curitiba e a única maneira de chegar lá é dirigindo 18
quilômetros por uma estrada de terra sem nenhum movimento. A casa
principal não tem móveis nem telefone. Até a piscina e a churrasqueira,
teoricamente dispensáveis, podiam ser úteis. A única coisa inconveniente era a
presença de câmeras de segurança com as quais o proprietário gravava o que
acontecia do lado de dentro e podia dar uma espiada para conferir se estava
tudo sob controle. Esse foi o local escolhido pelo Primeiro Comando da Capital
(PCC) para servir de cativeiro do hoje senador Sergio Moro, que, graças a um
imprevisto, escapou do sequestro e provavelmente da morte na mais ousada
ação planejada pelo grupo desde que ele foi criado, há trinta anos.


VEJA teve acesso à íntegra da investigação sigilosa, que, em março, prendeu
nove pessoas que participaram do planejamento do crime. Os documentos
revelam o nível de sofisticação do PCC, que, segundo os especialistas, já é
considerado uma das três maiores e mais bem estruturadas organizações
mafiosas do planeta. O grupo tem ramificações em pelo menos quinze países
europeus, em toda a América Latina, parcerias com criminosos italianos,
movimenta bilhões de dólares, controla o tráfico de armas e cocaína que passa
pelo território brasileiro e já se enfronhou na política. O caso do sequestro do
senador é o exemplo mais bem-acabado dessa mudança de patamar. Em
poucos dias, os criminosos mobilizaram gente, um arsenal, carros e muito
dinheiro para financiar uma operação que marcaria a chegada ao Brasil de
ações comuns em países dominados por cartéis como a Colômbia e o México. A
operação, abortada pela Polícia Federal, tinha o objetivo de trocar a vida de
Moro pela transferência de Marcos Camacho, o Marcola, líder da organização,
que está preso na penitenciária federal de segurança máxima de Brasília, para o
sistema prisional estadual de São Paulo, onde está grande parte da força motriz
do PCC. Os bandidos sabiam que as chances dessa negociação acontecer eram
mínimas. A provável execução do ex-juiz da Lava-Jato seria uma demonstração
de força e poder.

O processo tem mais de 6 000 páginas e mostra que a vida do ex-juiz foi salva pelo acaso. O plano do PCC era
sequestrar Moro no dia 30 de outubro, data do segundo turno das eleições. Sete meses antes, células da facção
levantaram todos os detalhes da rotina do então candidato a senador e prepararam a infraestrutura da operação. O
grupo rastreou os locais por onde o ex-juiz e sua família costumavam frequentar, o endereço residencial, os hábitos e
os horários. O plano era apanhá-lo no instante em que ele deixasse o local de votação. Na época, Moro estava a
apenas poucos dias sem o aparato de segurança que o acompanhou por anos. A escolha do cativeiro foi o último
movimento da quadrilha. Uma mulher procurou a dona da chácara por meio de um aplicativo de mensagens e
ofereceu pagar dez diárias. Não era praxe, já que o local era usado para festas de fim de semana, mas Tânia Castro, a
proprietária, concordou. “Coloquei logo um preço bem alto na diária para que a cliente desistisse, mas ela topou.”

A locatária, que havia se identificado como Luana, exigiu que o pagamento
fosse feito exclusivamente em dinheiro vivo e que ninguém, absolutamente
ninguém, aparecesse no imóvel enquanto ela e seus hóspedes estivessem no
local. Tudo no enredo parecia estranho — e era. No dia seguinte à ocupação da
casa, as câmeras de segurança foram subitamente desligadas, e a central de
armazenamento das imagens, instalada em um poste a 5 metros de altura,
desapareceu. Preocupada, Tânia Castro decidiu vistoriar a região com um
amigo policial. Não havia mais ninguém — restos de uma refeição eram o único
indicativo de que hóspedes estiveram no local. “Eu poderia ter morrido no
instante em que entrei de volta na minha própria chácara. Só soube que aquele
pessoal era do PCC tempos depois, quando um delegado federal me telefonou
para pedir que fizesse o reconhecimento de uma das pessoas envolvidas”,
relata. Nem ela nem ninguém imaginavam que algo daquela magnitude estaria
em andamento.

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