MP aponta que família com sobrenome forte na política usou prefeitura do RN para lavar dinheiro do tráfico

Antes do Primeiro Comando da Capital (PCC) se estabelecer no Rio Grande do Norte no início do século passado, Laete Jácome de Oliveira, o patriarca da família Jácome, dedicava-se ao contrabando de mercadorias, conforme apurado pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN). Para realizar suas transações comerciais, Laete, agora com 67 anos, viajava para São Paulo, onde ele e seus quatro filhos ampliaram suas conexões no submundo do crime, estabelecendo relações com membros da facção criminosa de São Paulo.

Foto: Arte/Metrópoles.

Os irmãos Deusamor e Leidjan Jácome expandiram suas atividades além do contrabando, passando a comercializar drogas no Rio Grande do Norte. Enquanto isso, o patriarca se envolveu na política local em João Dias, uma cidade de cerca de 4 mil habitantes localizada a aproximadamente 360 quilômetros da capital, Natal. Laete foi eleito vereador de João Dias em 2020, e sua filha, Damária Jácome, foi eleita vice-prefeita. De acordo com informações do Metrópoles, ela assumiu a prefeitura da pequena cidade potiguar em pouco tempo, por meio de ameaças ao prefeito, sendo posteriormente afastada do cargo pela Justiça local.

Segundo o MPRN, a família Jácome ascendeu ao poder local através de sua associação com o PCC e utilizou a prefeitura de João Dias para lavar dinheiro do tráfico de drogas. Os dois filhos envolvidos no tráfico foram mortos na Bahia em outubro de 2021, supostamente em um tiroteio com a Polícia Civil.

Damária e seu pai Laete foram acusados pelo MPRN de extorquir o atual prefeito de João Dias, Francisco Damião (PP), em dezembro de 2022. Ele havia renunciado ao cargo em 27 de julho do ano anterior, após ser ameaçado de morte pelos irmãos de Damária.

Documentos judiciais do Rio Grande do Norte, obtidos pelo Metrópoles, mostram que Francisco afirmou ao seu chefe de gabinete que “quem dava a última palavra” nas decisões da prefeitura eram Deusamor e Leidijan, até que eles foram mortos na Bahia, onde estavam foragidos.

Eles financiaram a campanha de sua irmã e, segundo o promotor Augusto Lima, “usaram a prefeitura para realizar transações criminosas, sem chamar a atenção”. Após constatar o envolvimento de Damária com o crime, o MPRN lançou uma operação, resultando no processamento de Damária e seu pai e na perda de seus direitos políticos. Com a ação, Francisco retornou à prefeitura. Atualmente, Laete e Damária estão cumprindo pena em regime aberto por extorsão – ambos negam as acusações.

O crime de extorsão foi investigado através da Operação Omertà, na qual o MPRN também conseguiu desvendar o esquema de lavagem de dinheiro do tráfico de drogas, através de movimentações de empresas de fachada ligadas à família Jácome.

Em uma concessionária que tinha apenas um carro, a Promotoria identificou que cerca de R$ 6 milhões circularam em um período de dois anos. Para não chamar a atenção, foram feitos depósitos fracionados de R$ 2 mil e R$ 5 mil.

O enriquecimento da família ocorreu, segundo o promotor, devido ao envolvimento dos irmãos com o tráfico de drogas. A associação deles ao PCC foi possível graças ao interesse da facção pela BR-116, uma rota estratégica para a maior organização criminosa do Brasil escoar cocaína, através do Porto do Ceará, para a Europa e África.

Com 4.610 quilômetros de extensão, a rodovia federal atravessa praticamente todo o país, ligando os estados do Rio Grande do Sul e Ceará, onde se localiza o Porto do Mucuripe, em Fortaleza.

Na mesma região de João Dias está a cidade de Jardim de Piranhas, terra natal de Valdeci Alves dos Santos, o Colorido, ex número 2 do PCC nas ruas e que atualmente está preso no sistema penitenciário federal, onde foi jurado de morte por Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, em meio a uma divisão histórica na cúpula do PCC.

O território também é ocupado por igrejas de Geraldo dos Santos Filho, o pastor Júnior, irmão de Colorido. Como mostrado pelo Metrópoles, ele construiu um patrimônio avaliado em pelo menos R$ 6 milhões operando um esquema de lavagem de dinheiro para o PCC, usando, entre outros meios, a compra de templos religiosos.

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