VIRALIZOU NO TWITTER: Mulher relata que teve fotos e vídeos íntimos divulgados pelo ex-noivo em grupos de WhatsApp de trocas de conteúdos semelhantes

No Twitter, a empreendedora Ketlen Rodrigues, 21 anos, viralizou ao relatar que teve fotos e vídeos íntimos divulgados pelo ex-noivo em grupos de WhatsApp, sem seu consentimento. Os espaços são integrados por homens casados, e essa era a forma dele de conseguir conteúdos de outras mulheres. A revista Marie Claire conseguiu que ela desse uma entrevista detalhando o episódio. ketlen diz que decidiu torná-lo público para alertar possíveis vítimas.

Ketlen Rodrigues terminou um relacionamento abusivo que durou quatro anos. O ponto final na relação veio em novembro de 2021, depois de ela descobrir que seu ex-noivo divulgou, com frequência, fotos e vídeos de momentos íntimos dos dois sem seu consentimento.

O conteúdo foi postado por ele em grupos de WhatsApp formados por homens casados que se diziam adeptos do cuckold – fetiche em que sujeitos gostam de ser traídos – e do voyeurismo digital. Por sua vez, esses integrantes também divulgavam conteúdos semelhantes de mulheres com quem estavam se relacionando.

“Fiquei gelada, em choque, paralisada. Ao mesmo tempo, pensei: será que todas essas mulheres sabem que elas estão aqui?”

Empreendedora Ketlen Rodrigues, 21 anos

Tanto em grupos como em conversas privadas com outros homens, ela se viu em diversos vídeos durante relações sexuais; e se sentiu violada. No último dia 15, a história de Ketlen viralizou depois de ela decidir torná-la pública por meio do Twitter. O tom da postagem era de alerta.

“Meninas, tomem cuidado com o que é gravado no celular dos namorados de vocês. Meu ex sempre gravava e tirava foto, e até aí tudo bem. Mas pegando conversas no celular dele, desconfiando de outras coisas, acabei achando milhares de grupos de homens com fotos e vídeos meus”

thread em que Ketlen expõe os acontecimentos foi vista mais de 8 milhões de vezes e curtida por 77 mil pessoas. Também recebeu mais de 9 mil comentários. A maioria deles é de mensagens de apoio, mas houve quem a procurou para dizer que passou pela mesma situação.

Um dos comentários diz: “Minha amiga passou por isso e terminou em maus termos. O ex expôs os vídeos, mandou para páginas no Twitter. Ainda hoje, não temos como saber quantas pessoas tiveram ou ainda têm acesso a eles”, escreveu um usuário. Outra mulher diz que teve medo depois de ler o relato. “Meu marido tem vários vídeos no computador dele. E agora? E se eu pedir pra ele apagar e ele ficar puto?”, questiona

Desde 2018, a lei nº 13.722, chamada de Lei Rose Leonel, permitiu a criminalização de vazamento de fotos e vídeos com cenas de nudez ou ato sexual sem autorização pela Lei Maria da Penha. A legislação também reconhece o ato como “violação da intimidade da mulher” e uma forma de violência doméstica e familiar.

No mesmo ano, a Lei da Importunação Sexual (nº 13.718/18) também reforçou o crime ao incluí-lo no Artigo 218-C no Código Penal, que prevê pena de 1 a 5 anos de prisão – com possibilidade de aumento “se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação”.

Depois de viralizar, ela passou a receber ameaças de processo por calúnia e difamação do ex-noivo. Neste fim de semana, ela realizou boletins de ocorrência na Delegacia da Mulher e na Polícia Civil do município de Rio Grande, no Rio Grande do Sul. Nesta segunda-feira (20), a Polícia Civil liberou uma medida protetiva contra o homem.

Ketlen conta que se surpreendeu com a proporção que sua história tomou, mas que pretende usar o alcance que conseguiu para ajudar outras mulheres que enfrentam o mesmo crime que ela.

“Não tenho como reverter o que aconteceu comigo. O que posso fazer é ajudar outras mulheres a não passarem pelo mesmo”.

Veja entrevista completa:

“Eu e meu ex começamos a namorar em novembro de 2018, e passamos quatro anos juntos. Antes de descobrir [a divulgação de conteúdo íntimo], eu já queria terminar, porque os últimos dois anos do relacionamento foram uma verdadeira tortura. Ele já me desrespeitava, me tratava como última opção e dava em cima de outras mulheres. Ia dormir chorando, e cheguei a ouvir dele que meu barulho estava atrapalhando. Eu estava tentando salvar o relacionamento.

Quando ele me pediu para gravar vídeos, confesso que não entendia muito bem o motivo. Ele dizia que era para guardar para ele, mas não fazia sentido, porque já morávamos juntos. Por um lado, acho que uma pessoa manipuladora faz você pensar que aquilo é para o seu bem quando, na verdade, é para o bem dela própria. Então, me sentia elogiada, bonita e desejada. Pensava que ele gostava tanto que queria guardar para ele. Confiei nele e não consegui ver maldade.

Fui percebendo que ele era muito superprotetor com o celular. Eu não podia usar o dele para tirar uma foto, por exemplo, que ele ficava tremendo, batendo o pé no chão, visivelmente nervoso. Dizia até que era falta de respeito. Sempre achei muito estranho porque, em tese, ele não tinha nada a esconder. Antes, eu nunca tinha visto nada nesse sentido no celular dele. Nunca nem pensei que ele poderia me trair.

A gente dividia o mesmo computador, que era da minha sogra (nós morávamos no mesmo pátio que ela). Certo dia, fui mexer nele e vi que o WhatsApp dele estava logado. Pensei em dar uma olhadinha, senti que devia fazer isso.

Do nada, me deparei com a palavra ‘gostosa’ em uma conversa e estranhei. Vi que era uma conversa com um cara e, depois, que estavam em um grupo em comum. Quando olhei, fiquei surpresa. Tinham muitos conteúdos íntimos e que se referiam às mulheres como putas, ou como se fossem propriedade deles.

Fui vendo que tinham mais grupos, com nomes como ‘Mostre sua puta’ ou ‘Corninho’, supostamente de homens que gostam de ser corno, que é um fetiche que existe. Comecei a pesquisar e ler as mensagens, e notei que era uma forma desses caras divulgarem as esposas deles. Elas recebiam elogios de outros homens e isso dava prazer a eles, como se as mulheres deles fossem seus troféus.

Quando eu vi que eu era uma das mulheres que estava ali, fiquei nervosa, com o coração acelerado. Fiquei gelada, em choque, paralisada. Só que ao mesmo tempo, pensava: será que essas mulheres sabem que elas estão aqui? Eu já não tinha mais o que fazer por mim, então comecei a me preocupar com as outras mulheres. Cheguei a pensar que, talvez, o prazer para o meu ex era fazer isso escondido, sem minha permissão.

Lembro que fiquei a madrugada inteira tirando prints de tudo. Passei os próximos três dias monitorando como ele fazia esse uso e em quais horários. A ideia era ter feito isso por uma semana, porque queria saber o que estava acontecendo de fato, mas não aguentei.

Um dia, ele disse que queria fotos de ‘uma gordinha’. No mesmo dia ele tinha me esculachado, dizendo que eu estava muito magra, com muita olheira, que só trabalhava e precisava descansar. Quando vi a mensagem, entrei em colapso. Passei dias sem comer e sem falar, fingindo que não tinha visto nada.

Meu ex chegou a negar quando o confrontei. Ele chegou a se fazer de desentendido, mas mostrei que sabia de tudo. Foi muito difícil, porque, mesmo assim, eu o amava. Quando ele assumiu, disse que estava envergonhado e até tentou dizer que fez uma vez só. Mas comecei a questioná-lo sobre o tempo que ele passava a mais no banheiro ou na cozinha.

Perguntei a ele se estava gostando mais de ficar dentro desses grupos do que de estar comigo, e ele disse que sim. Por muito tempo questionei se eu estava exagerando, se isso não era só ‘coisa de homem’. Nós terminamos depois disso. Me senti traída.

Passei muito tempo pensando se deveria divulgar isso ou não, porque pensava na família dele, que sempre foi legal comigo. Não quis nem denunciar porque não queria trazer essa história toda à tona. Mas, enquanto uma mulher feminista, comecei a me sentir mal. Levanto tanto a bandeira de que as mulheres não devem se calar e eu estava fazendo justamente isso. Me senti hipócrita e questionei se não estava o defendendo ou o acobertando.

Moro em uma cidade pequena, e pensei que o tweet iria repercutir só por aqui. Não imaginei que ia ter gente do Brasil inteiro curtindo, nem a quantidade de pessoas que se solidarizaram. Uma advogada se disponibilizou para me atender pro bono. Recebi vários relatos no privado de mulheres que disseram passar pela mesma coisa.

Meu ex-noivo viu o tweet e me disse que eu deveria tirá-lo do ar, que estou tentando fazer justiça com as próprias mãos, que não era certo. Me disse que está sofrendo ameaças, mas duvido, porque pedi prints disso e ele não mandou. As pessoas só estão perguntando se é verdade, ou o porquê de ter feito isso. Então, ele só está colhendo o que plantou. Mesmo assim, ele ameaçou me processar por calúnia e difamação, disse que consegui as provas ilegalmente. Acredito que seja um blefe, mas dá medo. Por isso, além da denúncia, quero pedir uma medida protetiva [a entrevista aconteceu na noite da última sexta-feira, 17 de março, antes de Ketlen conseguir a medida protetiva].

Toda essa questão me fez ver que eu deveria me engajar mais, ajudar outras mulheres que podem estar passando pela mesma situação, mas também por violência doméstica, verbal ou psicológica. Tenho amigas com iniciativas voltadas para mulheres e sempre quis me envolver. Agora, pretendo fazer isso ao levar esse assunto a elas. Também planejo tirar do papel os planos de dar cursos de costura de maneira voluntária, sem custo. Quem sabe assim mais mulheres comecem a usar isso para ter independência financeira e não dependerem mais dos maridos.Não tem como eu reverter meu caso. Vou seguir com sequelas disso, independentemente de quanto tempo passe. Mas o que posso fazer é ajudar outras mulheres a não passarem pelo mesmo – ou, se já estiverem passando, que saiam dessa relação o mais rápido possível.”

fonte: M.C

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